quarta-feira, 24 de agosto de 2016

O Casarão - parte 3


O professor Rodolfo Freitas foi o primeiro a correr. Jorge, o assistente e namorado de Soraia também correu quase que imediatamente. Subiram as escadas saltando dois ou três degraus de cada vez e deram de cara com a porta do banheiro fechada. O professor colocou as mãos na maçaneta velha e enferrujada, mas ela não girou e a porta não se mexeu. Tentou forçar, mas por mais força que empregasse, não houve sequer um mínimo sinal de movimento da maçaneta ou da porta.

Os gritos de Soraia eram desesperados e extremamente altos. Não eram um pedido de socorro, mas os dois homens parados do lado de fora do banheiro sentiam que era isso que os gritos representavam. Algo estava acontecendo com ela dentro do cômodo e eles tentavam mover a porta com urgência.

Chamaram por ela e perguntaram o que estava acontecendo, mas como resposta somente mais gritos assustados.

Jorge pediu para o professor se afastar. Também tomou certa distância da porta e correu de encontro a ela, colidindo com o ombro direito e tentando forçar a abertura. Tentou por três ou quatro vezes, cada vez com mais força. A porta não deu nenhum sinal de estar cedendo.

O professor o segurou, quando Jorge se preparava para mais uma tentativa. Apontou para a fresta abaixo da porta. Havia água escorrendo pelo vão. Muita água. Então disse:

- Na bolsa amarela que deixei sobre a antiga mesa da sala de jantar, há um pé de cabra. Corra até lá para buscá-lo.

Jorge desceu as escadas ainda sob o som dos gritos desesperados da namorada. Os gritos eram cada vez mais ásperos; roucos. Como se a garganta de Soraia estivesse sendo machucada pelo terror.

Após cerca de cinco minutos, Jorge retornou ofegante e suando, carregando o pé de cabra. No desespero, nem reparou que os gritos de Soraia haviam cessado.

O professor tentava abrir a porta do banheiro aos chutes, como os policiais fazem nos filmes de ação de Hollywood. Mesmo chutando com força, a porta não se mexia.

- Por que demorou tanto? – Perguntou, limpando com a manga da camisa o suor que também escorria por seu rosto, fazendo os olhos arderem.

- Não estava na sala de jantar! A bolsa amarela estava na cozinha! Só fui notar depois de revirar as outras duas que estavam no lugar que o senhor disse!

Jorge enfiou o pé de cabra entre a porta e o batente, próximo da fechadura e começou a forçar. A madeira lascou um pouco e a extremidade da ferramenta penetrou um pouco mais no vão. O professor também começou a forçar o pé de cabra. Com a força e o peso dos dois, a alavanca ganhou eficiência, arrancando lascas da porta e do batente. Repentinamente, a fechadura cedeu e a porta abriu com um estalo.

Então, foi a vez de Jorge começar a gritar.

Havia sangue misturado com a água que escorria da torneira arrancada da parede. Soraia estava caída, com o lado esquerdo do rosto afundado. O olho esquerdo havia saltado da órbita e olhava para eles ainda preso ao nervo. Também era possível ver um pouco de massa cinzenta no chão.

 Aparentemente, Soraia havia caído da escada e batido com a cabeça na antiga pia de porcelana. Um pedaço dela jazia abaixo de seu rosto desfigurado. A porcelana branca estava imunda, mas mesmo assim realçava o sangue que escorria por ela. A queda parecera ter sido tão violenta, que arrancara também a velha e enferrujada torneira da parede.

A água suja jorrava como sangue pulsando de uma artéria perfurada. Lavava o sangue de Soraia daquela cena grotesca. Sua vida já havia escoado pelo vão da porta e descido as escadas junto ao riacho de água podre que escapava da parede.

A água suja também lavava as lágrimas de Jorge.

O professor passou um braço pelos ombros do rapaz para consolá-lo.


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